O punk cigano de Gogol Bordello

Há quem diga que nos últimos anos ninguém mais fez nada novo na música. Discordo. Claro que tenho uma espécie de saudade das cenas musicais já passadas, principalmente das que surgiram a partir da segunda metade do século XX – e tenho uma certa inveja daqueles que a viveram. Entretanto, apesar de as bandas exibidas pela mídia atualmente – e, logo, que fazem mais sucesso – não saírem muito da sua zona de conforto, mostrando muitas vezes a mesma música facilmente comercializada, e, mesmo quando vemos alguns artistas mais "arriscados" em grandes veículos midiáticos, como, por exemplo, Lady Gaga e Marilyn Manson – que, embora sejam dois artistas que eu admiro, uma vez que adoro o fato de Manson não ter medo de fazer provocações às instituições religiosas e Lady Gaga ter acabado com o padrão de estética de "princesa do pop" na música desse gênero com sua esquisitice (por mais que ela seja, sim, um produto muito bem criado) –, pode-se perceber que, na verdade, eles só são uma junção de tudo aquilo que já foi feito por outros artistas antes – como Madonna e David Bowie, Alice Cooper e Iggy Pop –  sem mostrar uma característica própria.

Porém, com a recente facilidade do acesso à música – e não só à música em si, mas também no processo de criação dessa –, temos um acervo cada vez mais crescente de bandas e gêneros musicais diferentes. Prova disso é a dificuldade para encaixar uma música num gênero musical, tamanha são as influências e experimentações. A partir daí, repito que há, sim, artistas que ainda ousam experimentar musicalmente e trazer inovações – mesmo que isso não os leve, necessariamente, à grande mídia.

Dito isso – e para confirmar o que foi dito –, apresento-lhe Gogol Bordello. A banda é liderada pelo vocalista ucraniano – descendente de ciganos Servo Roma – Eugene Hütz (ou, quem preferir, pode chamá-lo de Yevgeniy Aleksandrovich Nikolayev, seu verdadeiro nome), e composta por mais sete integrantes – vindos da Rússia, Equador, Estados Unidos, China, Etiópia e Israel.

Para fazer suas músicas, a banda se inspira principalmente na música cigana do Leste Europeu, depois a mistura com o punk, dub (ritmo jamaicano), acrescenta violino, acordeão, às vezes saxofone, e o que mais lhe derem vontade – como, por exemplo, o frevo pernambucano, presente na música "In The Meantime In Pernambuco", do álbum "Trans-Continental Hustle", inspirado naquilo que Eugene viveu enquanto morou no Brasil, sendo este apenas um entre tantos países em que o cantor já residiu.

A constante experiência de Hütz como imigrante também pode ser vista nas letras de suas músicas, que às vezes podem até ser escritas com idiomas diferentes misturados. Mas, além disso, críticas sociais não se fazem menos presentes, como, por exemplo, em "Supertheory of Supereverything", na qual canta "I don't read the Bible/ I don't trust disciples [Eu não leio a Bíblia/ Eu não confio em discípulos]" ou em "American Wedding", sobre o tradicional casamento americano, que diz "I understand the cultures/ of a different kind/ but here word 'celebration'/ just doesn't come to mind [Eu conheço culturas/ das mais diferentes/ mas aqui a palavra "celebração"/ apenas não vem à cabeça]".

Toda essa mistura das mais diversas influências resulta em divertidas músicas que, apesar de não agradar tantas pessoas assim – principalmente àquelas acostumadas apenas com a mesmice musical que falei anteriormente –, produz um som original e difícil de ser assimilado a bandas as quais estamos acostumados a ouvir. Seu trabalho é exposto de forma bastante teatral e com forte presença de palco em suas apresentações. Para os que procuram por algo feito por artistas que realmente apreciam fazer música e não a veem unicamente como comércio, que fogem da "popzação" a qual muitos se submetem – que faz Coldplay e Taylor Swift soarem quase a mesma coisa – e que acham que não é mais possível fazer algo novo na música, Gogol Bordello, por criar uma música refletindo sua própria cultura, essa que pode ser descrita como formada através da adoção do que há de melhor em todas as outras culturas, pode surpreender.


Fonte das imagens (respectivamente): Last.fm b-ritmos.

2 comments:

  1. Muito bom msmo!!
    Uma banda que eu acho que faz um som muito bom, cheio de misturas é Diablo Swing Orchestra.
    Fica a dica

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  2. O que gosto em bandas como Gogol e Beirut é algo que você citou bem ali no meio do texto. O "criar uma música refletindo sua própria cultura, essa que pode ser descrita como formada através da adoção do que há de melhor em todas as outras culturas". Como apreciador de música procuro não me ater a nacionalidade, e sim procurar na Índia, na França, Alemanha, México, Islandia grandes expoentes. Pra mim é fantástico encontrar artistas que misturam tudo. Destaco, além do Beirut, a parceria do Mumford And Sons, Laura Marling e o Dharohar Project no India Tour EP (ver http://youtu.be/n3XpmCQsN0E).

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