Caçado

Em Outubro do ano passado, fiz um post em homenagem ao Dia dos Professores, “Duas lições”, e nele indiquei dois ótimos filmes que tinham como base a relação entre alunos e professores. E parece que esse cenário é ótimo para se fazer grandes filmes, pois “A Caça” é um filme incrível e que me fez sentir angustiado e com raiva como há muito não sentia, além de confirmar ainda mais o motivo de eu amar tanto a Sétima Arte.

O filme, estrelado por Mads Mikkelsen ("Hannibal") e dirigido por Thomas Vinterberg ("Querida Wendy"), é uma verdadeira obra-prima. Nele, Lucas, um professor de creche recém-divorciado, que vive no que parece ser uma típica cidade pequena dinamarquesa, é injustamente acusado de abusar de uma de suas alunas, o que faz com que sua vida comece a desmoronar por completo. Ele é demitido, seus amigos, e até mesmo seus familiares, desconfiam dele e reagem de diversas formas, desde as mais amáveis até as mais odiosas. O filme acompanha a vida de Lucas por cerca de um ano e mostra as consequências dessa, como ela mesmo diz, bobagem feita por Klara (a aluna de cinco anos que diz ter sido abusada e que também é filha do melhor amigo de Lucas) para se "vingar" dele. O nome do filme tem relação com a tradição local de caça, havendo até uma cerimônia quando um garoto chega à idade adequada para caçar, na qual o mesmo recebe uma arma, o nome também é uma alusão ao fato de Lucas ser “caçado” pelos moradores da cidade após as acusações feitas por Klara chegarem ao conhecimentos de todos.

Acalme-se, porque não, eu não dei nenhum spoiler, o que contei é apenas o “clima” do filme, que fica claro logo nos primeiros minutos dele. O que realmente importa são os questionamentos que ele nos proporciona, como, por exemplo, logo que a notícia sobre o suposto abuso se espalha, os próprios amigos de Lucas reagem de forma hostil, das maneiras mais brandas às mais violentas, mas será que nós não reagiríamos da mesma forma? E se seu filho dissesse para você que sofreu abusos por um adulto, como você reagiria? E se esse adulto fosse seu melhor amigo? O filme também nos deixa desconfortáveis durante sua maior parte, as injustiças que Lucas sofre nos causam revolta e até um pouco de vergonha ao nos imaginarmos nos lugares dos agressores/agredido além da vontade de socar Klara só aumentar com o passar do tempo. Outro destaque do filme são as atuações, realmente magnificas, inclusive da pequena atriz que interpreta Klara.

Lars Von Trier (roteiro) e Thomas Vinterberg (direção) no set de filmagem de Querida Wendy.
Para quem não conhece Thomas Vinterberg, ele criou em 1995, juntamente com Lars Von Trier ("Dogville"), um movimento cinematográfico denominado de Dogma 95, com o intuito de criar um cinema menos comercial e mais realista. O movimento possui 10 regras, entre elas: são proibidos truques fotográficos e filtros; o filme ocorre no tempo atual; a câmera deve ser usada na mão; o diretor não deve ser creditado; o som não deve jamais ser produzido separadamente da imagem ou vice-versa. Ainda que mesmo os fundadores do movimento não tenham seguido piamente todas as regras e tenham cada vez mais se desligado delas com o passar dos anos, Thomas e Lars foram capazes de criar uma estética de filme característica, a qual influenciou e influencia o cinema até os dias de hoje. Dentre os diretores que contribuíram para o movimento destacam-se os próprios criadores (Thomas e Lars), Harmony Korine ("Spring Breakers") e Susanne Bier ("Coisas que Perdemos pelo Caminho").

E, como de praxe, termino com uma referência ao que escrevi, no caso, uma frase dita no filme:

“O mundo está cheio de maldade, mas se ajudamos uns aos outros a maldade acaba indo embora."


Fonte das imagens (respectivamente): The Film Stage e CineMagia.

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