Embora conte com forte apoio popular, a proposta de redução da maioridade penal para 16 anos ou menos deve ser repensada e, de preferência, negada, principalmente devido a sua ineficácia e insensibilidade.
Parte desse apoio popular, sem dúvida, se dá em decorrência da grande mídia, que, com seus alardes sensacionalistas, nos faz acreditar que nada acontece com o jovem que infringe a lei, ou seja, que confunde impunibilidade com impunidade.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê sanções contra esses infratores, tais como advertência, liberdade assistida, semi-liberdade, obrigação de reparar o dano e prestações de serviços à comunidade. Além disso, prevê também a hipótese de internação, limitando essa ao prazo máximo de 3 anos ou até o adolescente completar 21 anos, conforme seu art. 121, parágrafos 3º e 5°.
Ademais, as pessoas parecem não levar em conta o fato de que os crimes cometidos por menores representam apenas 10% deles, grande parte em decorrência das guerras de quadrilha e do tráfico de drogas. O que nos leva a outro argumento usado pelos apoiadores da redução: o fato de os traficantes se utilizarem de menores para auxiliá-los no tráfico. Porém, o que eles parecem esquecer é que, se a maioridade penal for reduzida a 16 anos, nada ia impedir esses traficantes de se utilizarem de menores com 15, 14, 13, 10 anos ou até menos.
Um outro fato interessante é que, com exceção dos Estados Unidos e Inglaterra, todos os demais países que apresentam maioridade penal inferior a 18 anos são considerados pela ONU como países de médio ou baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o que torna a punição de jovens infratores ainda mais complicada. É impossível querer comparar países como EUA e Inglaterra com o Brasil, pois neles a juventude tem assegurada condições mínimas de saúde, alimentação e educação, enquanto que em países como o Brasil isso está longe de acontecer, visto que apenas 3,96% dos adolescentes que cumprem medidas sócio-educativas concluíram o Ensino Fundamental e sendo a sua maioria provenientes dos bairros mais pobres e violentos. Primeiro o Estado precisa assegurar tais condições e só depois, talvez, poderá pensar em alterar a lei.
Nesse sentido, como o Brasil, com um sistema carcerário extremamente precário e com um déficit de vagas superior a 80.000 pode querer jogar mais pessoas lá sem perspectivas de melhora, já que os presídios são reconhecidamente verdadeiras faculdades do crime? A colocação de menores neles (em companhia dos criminosos adultos) teria como conseqüência inevitável a sua mais rápida integração no crime organizado. Basta lembrar que os dois grupos que mais amedrontam hoje o Rio de Janeiro e São Paulo (Comando Vermelho e PCC) nasceram justamente dentro dos nossos presídios.
Tendo isso em vista, o ECA leva em consideração as questões psicológicas que levaram tal jovem ao mundo do crime, ao contrário da típica estrutura do pensamento conservador, que joga a discussão para o plano da responsabilidade individual, como se as pessoas e suas características psicossociais não importassem. Não pretendo com isso afirmar que "filho de bandido também é bandido", longe disso, mas sabemos que a personalidade do indivíduo tem caráter muito subjetivo e que crianças que crescem e vivem em ambientes onde os limites morais não são tão claros, ou são distorcidos, apresentam dificuldade de discernir o certo do errado. Além disso, se essa criança vê que o seu vizinho, por exemplo, rouba e tem um tênis melhor que o dela, ainda mais quando ela não tem exemplos de limites em casa, ela é facilmente levada ao mundo do crime.
Portanto, para o ECA, o tratamento dessa criança ou adolescente é bem mais importante do que uma punição. Para isso, assegura educação, pois toda criança e adolescente tem o direito de estudar, receber tratamento psicológico, além de possuir um pleno convívio social e familiar, que é extremamente necessário, tendo em vista que o indivíduo ainda se encontra em processo de desenvolvimento psicológico, coisa que não seria possível nos presídios.
Não estou dizendo também que o ECA é perfeito e totalmente eficaz, tanto que não concordo com o prazo de 3 anos, mas tenho ciência de que não são só os menores que muitas vezes "escapam" da lei, temos exemplos diários de infratores maiores de 18 anos que conseguem driblá-la e de medidas paliativas pouco eficazes, como a lei dos crimes hediondos, por exemplo. No entanto, sei também que, se o Brasil chama a atenção por algum motivo em relação a esses jovens, é pela proporção de vítimas e não de infratores e que essa culpa atribuída a legislação penal brasileira não passa de mais uma medida adotada para tentar desviar o foco dos reais problemas e das reais causas da violência. Portanto, essa alteração seria mais uma promessa de solução mistificada.
Fonte das imagens (respectivamente): Humor na net e Pedalante.
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